Tenho acompanhado uma
discussão nas redes sociais no que se refere ao aborto.
Será que minha visão das
coisas anda tão deturpada assim? Ou será que as pessoas, no calor do debate,
acabam se perdendo nos trilhos do assunto e acabam descarrilando os mais
diversos vagões carregados com os mais variados tipos de ideias? – algumas delas
sem o menor sentido.
Precisamos parar e analisar
alguns pontos. Percebo que nessa discussão - e em outras pode se aplicar o mesmo - estamos errando em dois pontos fundamentais
O primeiro é nossa postura
diante do contraditório. Virou moda destilar veneno, armar-se de ódio, unhas,
dentes, punhal, revólver e algumas outras armas, para entrar num debate.
No
nosso processo evolutivo, retrocedemos e resolvemos à moda antiga, dando ares de inspiração nos filmes de
“velho oeste”.
Um segundo ponto, não menos
importante, é a mistura que está sendo feita diante de um assunto tão complexo,
neste caso, o aborto.
Tudo começa com um PEC
(Projeto de Emenda à Constituição), que criminaliza o aborto, incluindo os
casos atualmente permitidos.
Sinceramente, a discussão começa muito antes de qualquer lei instituída. Pela escolha, ou não, a pena já é dada pela própria vida.
Uma das coisas que aprendi com
meus pais é: “não faça com os outros, aquilo que não quer que faça com você”.
Parece clichê, não é mesmo? Sim, e muito. Entretanto, se ampliarmos o contexto
ao que essa frase clichê pode ser aplicada, podemos nos surpreender.
Vamos inverter a receita dos
meus pais? Que tal fazermos para os outros o mesmo que queiramos que seja feito a nós?
Considerando os debates sobre
aborto em caso de estupro, tônica da atual discussão, pergunto: a quem queremos
punir? Estaremos resolvendo o problema com a execução de um aborto? Você, que
defende o “direito” ao aborto, pode até argumentar sobre o direito da mulher em
relação ao seu corpo, sobre os traumas decorrentes disso, enfim. Posso dizer
que em nenhum de seus argumentos, o bebê terá culpa. E mesmo assim, está sendo
sentenciado a morte por algo que ele não cometeu. Ao culpado pelo crime de
estupro, que seja aplicada a pena. Esse sim deve pagar (e muito) pelo que fez. Ao bebê, infeliz inocente, deve ser dada a pena capital por estar no lugar errado e na hora errada? Mais um número nessa guerra informal.
Outra coisa que você,
defensor(a) do “direito” ao aborto, pode dizer é: “é fácil falar tudo isso sendo
homem, quando você passa por nada disso”. Confesso que ouvir ou ler isso me
fere profundamente. Fere na dignidade de pessoa, de pai, de ser humano. De
fato, não posso engravidar, sentir o movimento de um ser dentro de mim,
amamentar ou viver qualquer momento próprio da mulher. Mas posso defende-lo. E
vou. Dentro do corpo de uma mulher grávida, pode ter outra mulher que terá seus
direitos defendidos. Poderá ter o corpo de um homem, que poderá ser educado
para ajudar a defender esses mesmos direitos.
Não quero discutir ou tirar
direito algum sobre o corpo da mulher. Não tenho esse direito. Ninguém tem. Porém,
estamos discutindo os direitos que devem ser mantidos sobre outro corpo que se
desenvolve dentro da mulher. Também não devem ser tirados. Não temos esse
direito. Ninguém tem.
Num estupro, a mulher fica
dilacerada em sua dignidade física e psicológica. Num aborto, também. Alguns
motivos que podem fazer do aborto uma escolha podem ser: olhar a criança e lembrar
da ferida, ter um filho não planejado – ainda mais, decorrente de uma violência,
enfim. Pois bem, optando pelo aborto, a mulher terá duas feridas para tratar: o
estupro e o aborto. Será que abortar é a saída menos traumática, já que traumas
existirão de uma forma ou outra?
Efeitos psicológicos (e por
vezes, físicos) precisarão de atenção especial, independente da escolha. Não há
como fugir disso.
Sigo em frente, defendendo o
direito a dignidade e a vida com a receita simples dos meus pais. Não quero
para outros, o que não quero que façam para mim.
João Borges
Escritor - Joinville/SC
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