segunda-feira, 9 de agosto de 2021

POR TRÁS DO ESPELHO

 


Quando eu a conheci, ela tinha saído de um relacionamento de vários anos. Carregava marcas evidentes de uma relação não saudável. Não era difícil notar que ela estranhava a atenção que eu dava. Gestos de carinho eram confundidos com “golpe”. Apesar da nitidez do envolvimento, a sensação de medo a rondava e, de certa forma, causava aquela confusão de não saber como pensar ou agir. A consequência era algum distanciamento. Pessoas assim ficam tão “cascudas”, que resistem em receber gestos genuínos de carinho. Infelizmente ela não havia sido acostumada com a generosidade.

Apesar disso, havia sorriso nela. Os lábios expressavam fagulhas momentâneas de uma sede imensa de felicidade. As vezes algumas frases soltas do tipo “você me faz bem” mostravam que ela estava dedicada a tentar mudar uma história de algumas escolhas infelizes. Como era bom ouvir ela dizer “Eu estava aqui pensando...”. Era a certeza de que ela queria minha companhia. E era muito bom quando isso era possível. Qualquer programa, por mais simples que fosse, me fazia sentir realizado. No fundo... bem no fundo, talvez o meu jeito de ser tenha se aproximado de um ideal que ela esperava em alguém. Não que eu fosse o cara perfeito, mas somando minhas imperfeições e colocando-as na balança, minhas qualidades poderiam ter um peso maior e que chamaram a atenção, de alguma forma.

Tudo isso me faz pensar a respeito das intenções dentro de um relacionamento. Como alguém ainda é capaz se supor uma relação baseada na dependência, seja ela qual tipo for? Como ainda existem pessoas que entendem a submissão, as vezes análoga a uma hierarquização quase militar, como uma forma de construir um “casamento”?

Relação boa é troca saudável. Respeito é indispensável e não se negocia. Reciprocidade não é toma lá, dá cá, mas uma gratuidade natural dada sem muito esforço. Leveza é uma busca que não pode ser deixada de lado. Carinho é um presente que precisa ser genuíno, verdadeiro. Enquanto existirem pessoas que não acreditam nessa pequena via e que preferem o caminho dos abusos velados, teremos filas nas portas dos consultórios de psicologia e infelizmente não será por terapia preventiva.

Ame e respeite a pessoa que está ao seu lado. Ali tem uma história de vida que ainda acredita. Não seja a pessoa que vai ajudar na construção de uma sociedade de pessoas transtornadas com relacionamentos de mentira ou que sobrevive apenas de aparências.

 

JOTA B


Nenhum comentário:

Postar um comentário

PERDI A CONTA

  Eu já perdi a conta das vezes que tentei te descrever. Faltou vocabulário. Faltaram adjetivos. Sobraram qualidades em meio aos defeitos...