segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

SIMPLES E INESQUECÍVEL, COMO A VIDA DEVE SER



Era um feriado de primeiro de maio de muito sol e calor. A data é comemorativa ao trabalhador, porém mais parecia o dia das crianças. Ruas movimentadas, pessoas seguravam crianças pelas mãos enquanto caminhavam pelas ruas do bairro, nas imediações da recém-inaugurada Ponte do Trabalho. 

Não eram os tempos de smarphones, tablets ou aplicativos de todo gênero. Era um tempo em que ter telefone fixo era investimento e a comunicação mais comum ainda dependia de papel, caneta, envelope, selos e correios. 

Eram lembranças da alegria daquele homem de cabelos brancos, olhos azuis, jeito calmo e simples. Nem parecia o mesmo homem que, por causa da morte de um parente próximo, assumiu as responsabilidades sobre uma criança, ainda que sua idade já lhe parecia avançada para isso. 

Na verdade, acabou criando tanto afeto que tratava a criança como a um filho. Tanto afeto, que a ideia de um eventual retorno da criança à família biológica, lhe trouxera depressão, e com ela, a tentativa de suicídio.

Olhar aquele rosto feliz e receber um convite para um passeio no feriado era o melhor prêmio que se poderia ganhar. Foram em caminhada pelas ruas do bairro vizinho. Em passos lentos, atravessaram a ponte de madeira, acompanharam o movimento intenso das bicicletas e de alguns poucos carros que transitavam, levando seus ocupantes para aproveitar aquele belo dia. 

Um pequeno, que agarrava com força os dedos das mãos enormes daquele homem, andava com um sorriso orgulhoso por poder desfrutar daqueles momentos.

Passado algum tempo de caminhada, chegaram a um sambaqui próximo a Ponte do Trabalho. Sem encontrar opções para as brincadeiras de uma criança naquele local, atravessaram a ponte. Na descida, logo após o término do pavimento da ponte, encontraram uma pequena inclinação de terreno, revestida de grama. Certamente veio a mente do homem de olhos azuis alguma lembrança da infância, pois pediu-lhe para aguardar naquela inclinação enquanto ele se embrenhava no meio do matagal próximo. 

Haviam muitas crianças caminhando com seus pais, passeando com suas bicicletas ou aproveitando o parque que havia não muito longe dali. A espera, apesar de angustiante, criava muita expectativa. O que será que foi buscar no meio daquele matagal?

O "logo" é um tempo com características distintas, vivida ao mesmo instante. Pode parecer demorado para quem espera, mas não para quem faz a ação; desaparecendo assim que existe o reencontro. Foi assim quando surgiu o mesmo homem que guiou o pequeno pelas mãos até aquele lugar, com algumas cascas de coqueiro nas mãos. 

Num primeiro momento não era possível entender, mas logo o mistério foi revelado. A casca serviria como uma espécie de prancha para a brincadeira de descer aquela inclinação de terreno. 

No começo era uma criança, uma casca de coqueiro e muitas risadas. Logo chegaram outras crianças e outros pais, repetindo todo o ritual de antes. Não demorou para aquele lugar virar parque de diversão improvisado. A brincadeira rolou solta durante várias horas. E nem parecia tanto tempo assim. Mais uma vez a dualidade do "logo" se fez.

A simplicidade da brincadeira, do momento, daquele calor e de uma casca de coqueiro realmente não importavam. De um momento de simplicidade partiu uma lembrança eterna. O estar perto, as boas gargalhadas que davam juntos, o caminhar de mãos dadas, nem de perto lembravam os momentos difíceis que aquele homem vivera.   

Logo escureceu, logo precisariam voltar. E tão breve quanto iniciou, aquele dia das crianças fantasiado de dia do trabalhador, acabou encerrando numa caminhada sorridente daquela criança e daquele homem inesquecível, o qual aquela criança tinha orgulho de chamar de PAI.

PERDI A CONTA

  Eu já perdi a conta das vezes que tentei te descrever. Faltou vocabulário. Faltaram adjetivos. Sobraram qualidades em meio aos defeitos...